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IMPLEMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS POR DECISÃO JUDICIAL

Fala pessoal. Como estão os estudos?

A decisão de hoje é fundamental para concursos da Magistratura, Defensorias e Procuradorias.

Atenção! Vai cair na DPERJ e no TJRJ! O caso tem origem no RJ!

Memorizem a seguinte tese:

“1. A intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas voltadas à realização de direitos fundamentais, em caso de ausência ou deficiência grave do serviço, não viola o princípio da separação dos poderes.

2. A decisão judicial, como regra, em lugar de determinar medidas pontuais, deve apontar as finalidades a serem alcançadas e determinar à Administração Pública que apresente um plano e/ou os meios adequados para alcançar o resultado;

3. No caso de serviços de saúde, o déficit de profissionais pode ser suprido por concurso público ou, por exemplo, pelo remanejamento de recursos humanos e pela contratação de organizações sociais (OS) e organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP)”.

Vamos agora a alguns fundamentos para uma eventual prova discursiva e oral.

Trata-se de recurso extraordinário interposto com base no art. 102, III, a , da Constituição Federal de 1988, contra acórdão do TJRJ, assim ementado:

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PRECEITOS COMINATÓRIOS VISANDO OBRIGAÇÃO DE FAZER. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO (ARTIGO 127 DA CF /88). SITUAÇÃO CAÓTICA DO HOSPITAL SALGADO FILHO. DEVER CONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO (ARTIGO 5º, CAPUT E 196) E DIREITO À SAÚDE DO CIDADÃO. FATO QUE ATINGE PRINCIPALMENTE, A CAMADA MAIS POBRE DA POPULAÇÃO, QUE NÃO POSSUI PLANO PARTICULAR E DEPENDE TÃO SOMENTE DA REDE PÚBLICA PARA ATENDIMENTO. POSSIBILIDADE DO JUDICIÁRIO EXERCER CONTROLE DE POLÍTICA PÚBLICA FUNDAMENTAL, FAZENDO OBSERVAR OS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E MORALIDADE (ARTIGO 37 DA CF). INEXISTÊNCIA DE DESRESPEITO À SEPARAÇÃO DOS PODERES. NECESSIDADE URGENTE DE CONTRATAÇÃO DE MÉDICOS E FUNCIONÁRIOS TÉCNICOS, DE MODO A PERMITIR O REGULAR FUNCIONAMENTO DO HOSPITAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO, PELO PODER PÚBLICO, DA IMPOSSIBILIDADE DE REMANEJAMENTO DE RECEITA ORÇAMENTÁRIA. PRECEDENTES DO STJ E STF. RECURSO PROVIDO PARA QUE SEJA CUMPRIDO O DÉFICIT DE PESSOAL, COM A REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO DE PROVAS E TÍTULOS PARA PROVIMENTO DOS CARGOS DE MÉDICO E FUNCIONÁRIOS TÉCNICOS, NOMEAÇÃO E POSSE DOS PROFISSIONAIS APROVADOS NO CERTAME, BEM COMO CORRIGIDOS OS PROCEDIMENTOS E SANADAS AS IRREGULARIDADES EXPOSTAS NO RELATÓRIO DO CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA, NO PRAZO DE 6 (SEIS) MESES, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA DE R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS)”.

No presente recurso, o Município do Rio de Janeiro alega violação aos arts. 2º e 196 da Constituição Federal. O recorrente sustenta que “[o] Judiciário pode, sim, rever o ato discricionário e, se for o caso, declará-lo nulo, pois nenhuma lesão de direito pode ser excluída da apreciação do Poder Judiciário; o que não pode, repita-se, é determinar que o agente público pratique um ato discricionário cuja escolha de conveniência e oportunidade lhe pertence”. Argumenta, ainda, que “[o] implemento do direito social à saúde na construção de hospitais, na contratação de profissionais da saúde e demais consectários administrativos pertinentes está adstrito à esfera da discricionariedade administrativa. Logo, o controle judiciário resta afastado quando existam duas ou mais alternativas válidas ou mesmo quando isto implique em substituir o juízo de oportunidade e conveniência do Administrador Público pela discrição jurisdicional” . Requer, por fim, o provimento do recurso.

Posta a controvérsia, vamos a alguns detalhes do voto importantes para concursos – com adaptações.

A Constituição Federal prevê, ao lado do direito subjetivo público à saúde, o dever estatal de sua efetiva consecução, que pressupõe “políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação” (art. 196). Para alcançar tal finalidade, fontes de receita relativas à seguridade social (arts. 195 e 198, § 1º) e o dever de gasto mínimo nas ações e serviços públicos de saúde (arts. 167, IV e 198, §§ 2º e 3º) se conjugam com a garantia de financiamento estável e progressivo (façam as remissões).

Como já assentei em outro voto, trata-se da dimensão objetiva ou institucional do direito fundamental à saúde, que também se revela na sua organização administrativa, por meio do Sistema Único de Saúde – SUS, concebido como uma rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços públicos de saúde que prima pela descentralização, pelo atendimento integral e pela participação da comunidade em sua gestão e controle (art. 198, caput ).

Ingo Sarlet retoma, a esse propósito, a existência de uma eficácia dirigente e irradiante dos direitos fundamentais, na medida em que eles contêm “uma ordem dirigida ao Estado no sentido de que a este incumbe a obrigação permanente de concretização e realização”, bem como “fornecem impulsos e diretrizes para a aplicação e interpretação do direito infraconstitucional”.

Para o autor, os direitos fundamentais são amparados por “deveres de proteção estatais”, que operam como verdadeiros “imperativos de tutela”, em consonância com o dever geral de efetivação atribuído ao Estado. Por isso,

“[…] é possível se extrair consequências para a aplicação e interpretação das normas procedimentais, mas também para uma formatação do direito organizacional e procedimental que auxilie na efetivação da proteção aos direitos fundamentais, de modo a se evitarem os riscos de uma redução do significado do conteúdo material deles ”.

Ou seja, segundo Sarlet, o reconhecimento de direitos subjetivos fundamentais, em favor dos cidadãos, implica também o direito à sua “proteção mediante a organização e o procedimento”, a fim de lhes assegurar objetiva consecução por parte do Estado.

Ora, no tocante ao mérito da demanda em apreço não há como deixar de reconhecer a presença de “imperativos de tutela”, considerada a forma como a Constituição de 1988 estruturou as garantias instrumentais de organização e procedimento para fins de proteção do direito fundamental à saúde. Isso porque o direito de acesso universal e igualitário às ações e serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde, a que se refere o art. 196, é realizado por meio de políticas sociais e econômicas que foram definidas, estruturalmente, no art. 198, na forma do Sistema Único de Saúde e do seu financiamento adequado.

O orçamento público deve obediência aos imperativos de tutela que amparam os direitos fundamentais, assim como, de fato, o direito à saúde, em sua dimensão de direito subjetivo público e, portanto, prerrogativa indisponível do cidadão, reclama prestações positivas do Estado que não podem ser negadas mediante omissão abusiva, tampouco podem sofrer risco de descontinuidade nas ações e serviços públicos que lhe dão consecução, com a frustração do seu custeio constitucionalmente adequado.

A noção do que seria tal custeio adequado obviamente há de se assentar em bases juridicamente estáveis (conforme garante o princípio da segurança jurídica) e fiscalmente progressivas (em consonância com os princípios da proporcionalidade e reserva do possível). Esse, por sinal, foi o sentido da análise empreendida pelo Ministro Celso de Mello no exame da ADPF-MC 45/DF, na qual asseverou não caber a manipulação da atividade financeira do Estado que inviabilizasse o estabelecimento e a preservação do direito à saúde:

“[…] a realização dos direitos econômicos, sociais e culturais – além  de  caracterizar-se  pela  gradualidade  de  seu  processo  de concretização – depende, em grande medida, de um inescapável vínculo financeiro subordinado às possibilidades orçamentárias do Estado, de tal modo que, comprovada, objetivamente, a incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal, desta não se poderá razoavelmente exigir, considerada a limitação material referida, a imediata efetivação do comando fundado no texto da Carta Política.

Não se mostrará lícito , no entanto, ao Poder Público, em tal hipótese – mediante indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político-administrativa – criar obstáculo artificial que revele o ilegítimo, arbitrário e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência .

Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da ‘ reserva do possível’ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível – não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade ” (ADPF-MC 45, Relator Ministro Celso de Mello, grifei).

É imperativa, pois, a conclusão de que, ao direito fundamental à saúde, correspondem garantias fundamentais de organização sistêmica (SUS) e de financiamento suficiente e progressivo, conforme a disponibilidade das receitas da seguridade social e o piso de custeio no setor.

Tal arranjo protetivo visa à máxima proteção do direito à saúde, na medida em que seu dever de realização progressiva decorre da lógica do próprio art. 5º, § 1º da Constituição, segundo a qual “a todas as normas de direitos fundamentais há de se outorgar a máxima eficácia e efetividade possível, no âmbito de um processo em que se deve levar em conta a necessária otimização do conjunto de princípios (e direitos) fundamentais, sempre à luz das circunstâncias do caso concreto”.

Se não é dado ao Poder Judiciário imiscuir-se na esfera reservada ao Executivo ou Legislativo, para substituí-los em seu juízo de oportunidade e conveniência, na mesma proporção, deve-se-lhe assegurar a atividade, para preservar o mínimo social que garanta a existência digna da pessoa humana, aí incluído um atendimento básico e eficiente de saúde. Ao Judiciário não cabe fazer, nem sequer interferir nas escolhas políticas de governo, mas lhe caberá, por determinação constitucional, avaliar o sistema de prioridades fixado. Isso porque o administrador não é livre nas escolhas dos fins, quando correspondam a bens constitucionalmente protegidos. Não se pode nulificar direito fundamental assegurado na Constituição, a pretexto de falta de recursos. Há que se resguardar, pelo menos, o núcleo indisponível do direito, apesar da realidade da escassez de recursos públicos, racionalizando a sua utilização”.

Nesse contexto, como anota Ana Paula de Barcellos,

“[…] o constituinte originário não deixou ao livre alvedrio do legislador ordinário, isto é, da maioria episodicamente no poder, o estabelecimento das prioridades e nem muito menos quanto devem investir nas áreas de educação e saúde, principalmente. Ao contrário, vinculou-o desde logo às prioridades que previamente estabeleceu, indispensáveis ao alcance das metas propostas, e, mais que isso, ao quanto se deve investir nos respectivos setores, de modo a tornar até mesmo sindicáveis pelo poder judicial as respectivas políticas públicas à luz do princípio da eficiência a que se submete a administração pública”.

Portanto, a reserva do possível está, de certo modo, casada com a necessária característica de serem os direitos sociais direitos a prestações . Os recursos públicos são escassos, mas, a despeito disso, devem sempre ser utilizados de modo a ampliar as prestações sociais que implementem os direitos sociais previstos em nossa Constituição”.

Não cabe omissão tampouco retrocesso no custeio do direito à saúde, ainda que não se possa pretender assegurar ilimitadamente – no campo das demandas individuais, inclusive judiciais, pela integralidade do direito à saúde – tratamentos alheios aos limites orçamentários, administrativos e tecnológicos da política pública.

Fernando Facury Scaff chega a afirmar a existência de um “orçamento mínimo social”, na medida em que “o constituinte não concedeu ao legislador tão ampla discricionariedade sobre quanto deve destinar do montante arrecadado para os gastos sociais. Isto porque a própria Constituição traz uma série de obrigatórias vinculações de receita às despesas sociais”. Daí é que sobressaem as “garantias constitucionais de financiamento dos direitos sociais” a que Scaff se refere.

Assim, contrariamente ao sustentado pelo acórdão recorrido, penso que não se está diante de normas meramente programáticas . Tampouco é possível cogitar de hipótese na qual o Judiciário estaria ingressando indevidamente em seara reservada à Administração Pública .

No caso dos autos, está-se diante de clara violação a direitos fundamentais, praticada pelo próprio Estado contra pessoas sob sua guarda, cumprindo ao Judiciário, por dever constitucional, oferecer- lhes a devida proteção.

A hipótese aqui examinada não cuida, insisto, de implementação direta, pelo Judiciário, de políticas públicas, amparadas em normas programáticas, supostamente abrigadas na Carta Magna, em alegada ofensa ao princípio da reserva do possível. Ao revés, trata-se do cumprimento da obrigação mais elementar deste Poder que é justamente a de dar concreção aos direitos fundamentais, abrigados em normas constitucionais, ordinárias, regulamentares e internacionais.

Em nenhum momento aqui se afirma que é lícito ao Judiciário implementar políticas públicas de forma ampla, muito menos que lhe compete impor sua própria convicção política, quando há várias possíveis e a maioria escolheu uma determinada .

Não obstante, o que se assevera, com toda a convicção, é que lhe incumbe, em casos como este sob análise, exercer o seu poder contramajoritário, oferecendo a necessária resistência à opinião pública ou a opções políticas que caracterizam o pensar de uma maioria de momento, flagrantemente incompatível com os valores e princípios básicos da convivência humana”.

Também em sede acadêmica já tive oportunidade de afirmar, ao citar a valiosa obra “A Era dos Direitos”, de Norberto Bobbio, que:

“Na era dos direitos, o grande protagonista é, sem dúvida nenhuma, o Poder Judiciário. (…) E a principal atribuição do Poder Judiciário, hoje, no século XXI, muito mais do que resolver problemas intersubjetivos, conflitos interindividuais, é ter o papel fundamental de dar concreção, dar efetividade aos direitos fundamentais, direitos estes compreendidos evidentemente, em suas várias gerações, como patrimônio da humanidade”.

Diante de todo o exposto, entendo que o acórdão recorrido não afrontou o texto constitucional, ao determinar que a recorrente realizasse de concurso público de provas e títulos para provimento dos cargos de médico e funcionários técnicos, nomeando e dando posse aos profissionais aprovados no certame, além de corrigir procedimentos e sanar irregularidades expostas em relatório do Conselho Regional de Medicina, dentro do prazo estipulado.

Vamos em frente e contem sempre comigo, queridas e queridos!

Dominoni (@dominoni.marco no instagram)

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